Alargando Horizontes

Dilemas

22-04-2015 00:00

 

Numa rua paralela à minha existe um campo, para onde comecei recentemente a ir passear as minhas cadelas. Racionalmente, escolhi ir para lá porque a minha mais velhota (a Tecas) não aguenta grandes passeios nesta fase da vida dela, enquanto a outra mais nova (a Fofa) precisa de mais actividade. Elas têm necessidades diferentes, e o que eu achava que elas precisavam que eu fizesse era levar cada uma em separado, andando menos tempo com uma e mais com a outra. Mas aqui juntava-se um terceiro factor: eu. Vivo num 3º andar sem elevador, e a Tecas foi ‘proibida’ pelo veterinário de subir ou descer escadas por causa dos seus ossos. Assim, 2 vezes por dia, tenho não só que descer do e subir ao 3º andar, mas tem sido necessário fazê-lo com 11 kg nos braços. Só a ideia de ter que duplicar o nº de descidas/subidas deixava-me cansada (sabe Deus o esforço que já era para mim, muitos dos dias nestes últimos 2 meses e meio, conseguir manter a rotina dos dois passeios diários, e dias houve em que não o consegui). Encontrei-me perante um dilema: a que necessidades vou responder eu? Quem privilegio em detrimento de quem? “Lamento”, disse eu às duas, “mas enquanto não surgir uma alternativa que satisfaça todas, tenho que dar primazia às minhas necessidades.” - por muito egoísta que isto soe, há alturas em que é vital.

Sem saber bem porquê, um dia decidi ir para esse tal campo. Costumava chegar ao cimo da minha rua e virar à direita, que vai dar a um descampado grande e tem acesso a várias ruas com espaços relvados (por onde eu costumava dar grandes passeios com elas, mas que fui encurtando dada a menor resistência física da Tecas, e a minha própria, a bem da verdade). Nesse dia, quando cheguei ao cimo da rua, decidi virar à esquerda e ir experimentar esse campo. Comecei por subi-lo e descê-lo, atenta aos sinais de cansaço da Tecas (e aos meus), mas tentando permitir à Fofa andar mais. Depois comecei a reparar que aquele campo era mais calmo que o descampado, havia menos pessoas a escolhê-lo para ‘recreio’ dos seus cães. Constatei isto uma vez, e outra, e outra… Até que pensei “Talvez dê para soltar a Fofa; ela dá a volta dela, e eu posso andar ao ritmo da Tecas”. Arrisquei - não porque a Fofa seja agressiva (é um doce com as pessoas!), mas não tem que gostar de todos os cães que aparecem nem de todos os comportamentos que eles têm, e pode, em ocasiões, reagir de forma menos simpática. Por isso andava pela trela, para respeitar os espaços e o direito ao passeio de todos os donos e cães com que nos pudéssemos cruzar. Fomos encontrando menos e menos cães a passeio - embora eu esteja sempre vigilante.

E percebi, eventualmente, que tinha encontrado a resposta para o meu dilema: conseguia, indo para aquele campo, satisfazer as necessidades de nós as três. Coloquei uma questão e a Vida mostrou-me o caminho; a intuição veio, e eu dei-lhe ouvidos, mesmo não percebendo que era isso que estava a fazer. Mas abri-me a experimentar algo diferente, porque o ‘habitual’ deixava-me com a sensação de estar a falhar a alguma de nós. E a recompensa veio.

Os dilemas surgem para que, na nossa busca de soluções e experimentando-as na práctica, possamos crescer. E surgem não por acaso, mas porque os co-criámos, em algum nível do nosso Ser. Obrigada, meu Ser!

Maria João Faria